Michael Sky
“Para o bebê (o modo como nasceu) faz uma grande diferença.
Se cortarmos o cordão umbilical imediatamente ou não fará uma grande diferença no modo como a respiração chegará até ele, tanto quanto as circunstâncias do seu gosto pela vida.
Se o cordão é cortado imediatamente após o seu nascimento, essa violência privará o seu cérebro de oxigênio. Assim o sistema de alarme é acionado e todo o organismo do bebê reage. A respiração é impulsionada para dentro do pulmão, como uma e resposta à agressão.
Entrando na vida, o que o bebê encontrará é a morte, e para fugir dela ele respira rapidamente. Para um bebê recém-nascido, o ato de respirar é um último recurso desesperado. O primeiro reflexo condicionado já foi implantado, um reflexo no qual respiração e angústia estarão sempre associados. Que feliz chegada a esse mundo!”
Dr Frederick Leboyer
Nós aprendemos a respirar na hora do nascimento. Aqueles que estão presentes – médicos, enfermeiras, pais e amigos – nos ensinam a respirar, embora raramente eles saibam que estejam fazendo isso. O nascimento é um acontecimento cheio de grandes desafios, que nos enche de energia emocional; por isso, a qualidade de nossas aulas de respiração é criticamente importante: acabamos de passar pela nossa primeira experiência desgastante e sobrevivemos a ela, estabelecendo assim, em nossa primeira hora de vida, um relacionamento fundamental entre energia, respiração e sentimento.
Mesmo na melhor das circunstancias, o nascimento é um evento altamente traumatizante, pois passamos nove meses num paraíso de águas mornas e de repente somos empurrados a um mundo estranho. O útero que nos mantinha e nos nutria tão maravilhosamente se torna nosso agressor. Somos forçados a um longo, árduo e terrificante trabalho uma luta total pela sobrevivência. Nossos corpos sofrem extraordinária dor a cada sinal da opressora contração. Em nossa mente também há uma dor muito grande, pois estamos sendo separados violentamente de tudo que conhecemos, da nossa fonte verdadeira, como se fôssemos flores expulsas do jardim.
Existem poucas situações em nossa vida adulta que podem ser remotamente comparadas a essa primeira prova (o nascimento, provavelmente, ganha de longe ou sai do jogo). Para a maioria de nós, é o momento que mais nos aproxima da morte, até que chegue o seu verdadeiro dia. Além disso, parece ser o maior teste de nossas vidas a situação mais desafiante com que nos deparamos e as respostas que encontramos durante essa prova naturalmente servirão como exemplos em nossas provas futuras; as aulas adquiridas no nascimento se tornarão a base para as nossas filosofias e estilo de vida.
Embora quando crianças obviamente ainda não estejamos física e verbalmente desenvolvidos, somos seres de grandes faculdades mentais e emocionais. Temos a visão, a audição, o tato, o paladar e o olfato; formamos crenças sobre o mundo baseadas em nossas experiências; desenvolvemos atitudes e preferências; aprendemos a confiar e a não confiar; a ter medo e a não ter; a amar e a não amar. Nós estamos perfeitamente cientes do mundo que nos rodeia, somos afetados positiva e negativamente pelas qualidades próprias do nosso mundo e crescemos como seres humanos individuais, de acordo com a natureza das nossas experiências.
A ciência ocidental nos dá uma explicação totalmente diferente sobre o nascimento. Ela acredita que o feto recém-nascido é, de certa forma, um ser pré-consciente e portanto não sofre nenhuma afetação na hora do parto. Pelo cérebro não estar ainda totalmente desenvolvido, muitos cientistas argumentam que as faculdades humanas da consciência, emoção, memória, entendimento e aprendizado, do mesmo modo não estão desenvolvidas. Em um profundo e espantoso engano, eles examinaram um recém-nascido e concluíram que não existia ninguém! Existia um corpo, mas não uma pessoa; existia dor, mas não emoção; experiências, mas não memória; consciência, mas não aprendizado.
Tragicamente, o que acontece é que realmente não importa como você trate tal criatura, contanto que esteja cuidando da sobrevivência do seu corpo. Visto que ela ainda não é um ser totalmente consciente, não sofrerá nenhuma ofensa ou não tirará nenhuma conclusão sobre o seu comportamento.
Entretanto, alguns pesquisadores estão começando a evidenciar o que qualquer mãe já sabe: que o recém-nascido é consciente, inteligente, compreensivo e impressionável. Na verdade, o recém-nascido é hiper-consciente – ele tem maior consciência sobre o mundo nas primeiras horas de vida do que provavelmente terá em algum tempo mais tarde. Ao mesmo tempo em que o recém-nascido desenvolverá gradualmente mecanismos inconscientes para se proteger da grande quantidade de informações sensoriais ás quais ele estará para sempre exposto ele precisa fazer isto para sobreviver e para evitar a sobrecarga sensorial como um bebê ele está muito aberto, totalmente receptivo e absorvendo todo o mundo através dos seus sentidos.
Conseqüentemente, o recém-nascido sofrerá com certeza e significativamente tanto quanto qualquer adulto; ele responderá ao sofrimento como um adulto, com toda a sua capacidade, ele aprenderá e se desenvolverá a partir dos acontecimentos dolorosos (e prazerosos) suas respostas atuais serão influenciadas pelas experiências passadas e influenciarão em seu futuro comportamento.
Visto que o mundo não é perfeito, obviamente o recém-nascido experimentará alguns acontecimentos ruins, desagradáveis e totalmente indesejáveis. Entretanto, ele possui um número limitado de respostas para tais eventos: Ele não pode fugir, brigar, reclamar suas razões, verbal ou inteligivelmente, ou fazer algo para mudar efetivamente a situação. Quando ele se depara com uma situação dolorosa e é incapaz de agir eficazmente, ele faz a única coisa que é capaz: reduz a respiração e a contrai, como energia, para longe da origem da dor. Ele se retrai física, mental, emocional e energeticamente, desligando-se da causa do seu sofrimento e se afastando rigorosamente do mundo prejudicial.
Apenas por alguns momentos, imagine um sofrimento emocional de uma criança. Seu retraimento, em todos os níveis, é óbvia e facilmente sentido. Embora provavelmente ela caia em prantos como um modo de respirar livremente, liberar energia retida dolorosamente e chamar a atenção e o auxílio do adulto ela se contrairá e se afastará da primeira dor. Ainda que chorando ela sempre resolva o sofrimento a energia é liberada e a situação é resolvida pelo adulto em muitas ocasiões, chorar não irá adiantar em nada, mas tornará as coisas piores, intensificando a dor e a contração.
É importante entender que, para a criança, contrair a respiração/energia na hora da dor é uma resposta saudável, natural e inteligente; é certo, próprio e crítico para a sobrevivência da criança, e faz sentido. Se ela tiver a sorte de crescer ao lado de adultos que compreendem as dinâmicas da resposta energética e que conhecem caminhos para encorajar o relaxamento e a solução dessas energias contraídas, ela superará todos esses sofrimentos e ao mesmo tempo aprenderá e crescerá de um modo saudável para enfrentar o futuro.
Entretanto, quando ela não recebe tais dedicações e a dor é extremamente traumatizante e/ou freqüentemente repetida, ela reterá a energia contraída como parte de sua experiência. Essa contração fixa de energia a afetará em todos os níveis como tensão física, neurose mental ou até como disfunção emocional, tornando-se uma parte vital da definição da sua personalidade; Será o exemplo principal através do qual ela experimentará o mundo e organizará suas respostas para os futuros acontecimentos.
Respirando – Ed. Gente