Angela Maria Lessa de Moraes
Com o aumento da esperança de vida, o número de mulheres com mais de 50 anos está tendo um rápido aumento e, em vários países, já constitui 15 a 20% do total da população.
A menopausa tem sido foco de atenção em várias partes do mundo. Podemos dizer que está “na moda” discutir as abordagens atuais e os progressos quanto às terapias hormonais, fito-hormonais, homeopáticas ou mesmo alimentares e fisioterápicas.
Apesar do tema climatério/menopausa estar atraindo o interesse de diversas áreas ligadas à saúde, tornando-se objeto de muitos estudos científicos, na literatura de Psicologia e Antropologia há muito pouco sobre o assunto e a desatenção com os aspectos integrais da mulher continua acontecendo. Os estudos são dirigidos mais para os transtornos físicos e para as soluções medicamentosas do que para os conflitos internos e sócio-culturais (familiar, conjugal e social) que podem acontecer nessa fase.
Quem é esse ser que chamam de mulher e que, por volta dos 40 anos de idade, entra na fase denominada climatério?
Em virtude das variações hormonais, a mulher apresenta ao longo de sua vida, fases diferenciadas que, embora façam parte de um processo natural, apresentam diferentes peculiaridades.
A criança se transforma em menina, que se transforma em adolescente e finalmente, com a completa maturidade sexual, atinge sua plena capacidade para engravidar, entrando na fase denominada reprodutiva. Essas fases, que podemos chamar de psicossexuais, vêm acompanhadas de modificações físicas e psicológicas as quais dependem da evolução particular de cada mulher e da interação dos fatores hormonais, características pessoais e ambientais. Na maturidade, acontece uma nova fase: o climatério, que ocorre antes e depois da parada total da menstruação, denominada menopausa.
A menopausa é um fenômeno natural que, em média, se instala aos 50 anos. É sabido que a fase de transição para a menopausa caracteriza-se por grandes mudanças físicas e também emocionais da mulher. No período pré e pós-menopáusicos são observadas alterações físicas como transtornos menstruais, no sistema nervoso central, sistema cardiovascular, trato genito-urinário, pele e ossos. Estes fenômenos costumam receber atenção predominante dos médicos e pesquisadores.
Estudos recentes têm dado especial ênfase à ação dos hormônios sexuais, em especial, o estrogênio e o seu efeito direto na parede vascular, assim como o seu papel vasodilatador e cardioprotetor.
O sistema músculo-esquelético também é considerado órgão alvo dos hormônios sexuais. A osteoporose e a osteoartrite se tornam cada vez mais freqüentes com o passar da idade.
A falta de informação ou mesmo informações distorcidas pelos meios de comunicação faz com que uma parcela significativa de mulheres vivencie essa etapa da vida como doença, independente de qualquer sintoma que apresente. A mulher nessa fase percebe-se e sente-se percebida de forma diferente.
O aspecto sócio-cultural também pode influenciar na fisiologia da mulher, através de fatores como alimentação, exercícios físicos, número de filhos e outros. Várias pesquisas também apontam uma variação de sintomatologia na menopausa entre mulheres de diferentes países e de diferentes níveis sócio-econômicos e educacionais. Isso indica que o fator hormonal e fisiológico não é o único determinante nessa fase. Por isso, a importância da abordagem holística e do atendimento integral da mulher, tendo uma visão dela como um ser bio-psico-social, começa a ser mais e mais reconhecida.
A mulher não pode ser vista como uma máquina que envelheceu e precisa de reparos ou reposições, e sim como uma pessoa que traz consigo toda uma história de vida, família, filhos, trabalho, alegrias, mágoas, esperanças e temores. A saúde e a doença não podem ser mais compreendidas como processos isolados, já que estamos tratando de sujeitos que interagem todo o tempo internamente e com o meio que os cerca.
O não reconhecimento das necessidades individuais, sejam orgânicas, psicológicas, sociais ou espirituais é apontado em pesquisas recentes como fator favorável à diminuição da eficiência das defesas naturais do corpo, aumentando assim a predisposição ao surgimento de doenças.
O atendimento à mulher pelo nosso sistema de saúde tem como objetivo principal a assistência diagnóstica e curativa de doenças. A relação médico-paciente nos ambulatórios públicos ainda tem como característica principal o anonimato. Na imensa maioria das vezes, com a escassez do tempo para o atendimento, procura-se escutar “o mínimo” a respeito da pessoa e “o máximo” sobre a doença que a levou à consulta. A mulher, na maior parte das vezes, não encontra respostas para suas dúvidas e chega ao término da consulta carregando os medos gerados por mitos a respeito desta nova fase de vida.
A grande maioria das mulheres procura o atendimento médico com expectativas e medos dos efeitos danosos que podem ocorrer com a chegada da temida menopausa.
Afinal, é uma doença a menopausa?
É muito disseminada a imagem de que a menopausa é doença e não um fenômeno biológico natural e que portanto, precisa ser tratada.
A parada da menstruação é vivenciada por algumas mulheres como perda da feminilidade, pois a experiência constante e cíclica do sangramento uterino é, para muitas, dotada de grande simbolismo.
A qualidade de vida às vezes é severamente reduzida com a crença de que está “muito velha” para refazer a vida pessoal ou profissional.
A auto-estima, por outro lado, é abalada quando se percebem mudanças, no dia-a-dia, ao se olhar no espelho, reconhecendo as marcas do tempo como uma ameaça à sua imagem corporal.
A sexualidade é também vista como tabu: existe a crença de que a libido diminui com a chegada da menopausa.
A gravidez, muitas vezes temida e indesejada nessa fase, seja por problemas sociais ou pelo risco que pode representar ao organismo, é outro fator de ansiedade para a mulher.
Os “calores” são encarados freqüentemente como transtornos psicológicos e que não merecem atenção. No entanto, muitos estudos já comprovaram que são sintomas reais, causados por vasodilatação periférica e variações do sistema termo-regulador hipotalâmico. Mas este não é um transtorno obrigatório e cada mulher o vivencia de forma única e particular.
A terapêutica com reposição hormonal é um tema em evidência na atualidade e os riscos e benefícios são exaustivamente discutidos por médicos, cientistas e pela imprensa leiga. Às vezes, ela é encarada como quase obrigatória para um melhor desempenho na vida e uma alternativa de preservar a saúde, mantendo a juventude.
Uma alternativa atual à tradicional terapia de reposição hormonal são os fitoestrogênios, proteínas derivadas da isoflavonas, encontradas na soja. Pílulas fitoterápicas vêm sendo lançadas no mercado, prometendo prevenir os transtornos da menopausa e o envelhecimento da pele.
Os antidepressivos surgem também como alternativas “milagrosas” para um reequilíbrio do humor.
Todas essas alternativas são medicamentosas e, de certo modo, reforçam a imagem de doença que tem a menopausa.
Para que se faça um atendimento integral à mulher, é necessária uma atenção médica, psicológica, educativa e reflexiva. É a integração de esforços para redimensionar o atendimento e o entendimento desta mulher inteira, saudável, com uma melhor qualidade de vida, integrada e em sintonia consigo mesmo, física e mentalmente, e também com o meio que a cerca.
A mulher precisa ser vista como um ser-no-mundo, confirmada e como agente de confirmação.
A assistência integral à saúde da mulher constitui um conjunto de ações educativas, preventivas, diagnósticas e de tratamento, com a participação de profissionais de várias áreas ligadas à saúde, integrados no mesmo entendimento do ser biopsicossocial que é a mulher, na sua relação consigo, com o mundo e com a nova etapa de vida que se apresenta.
O ginecologista, na maioria das vezes, é o primeiro profissional a ser procurado e pode atuar em muitos casos como um médico generalista, mas pode necessitar também da ajuda de outros especialistas: clínico geral, cardiologista, ortopedista, dermatologista, nutricionista, psicólogo etc. Porém, para um atendimento integral, não basta esta soma de especialidades. É preciso que a visão holística, onde o todo é maior que a soma das partes, predomine.
Além disso, por exemplo, trabalhos como conscientização corporal, reeducação postural e outros, coordenados por fisioterapeutas com esta abordagem holística, podem orientar uma melhor escuta do corpo e maior cuidado com suas necessidades naturais. A compreensão dos sinais do corpo é um recurso valioso no auto-conhecimento, que torna a mulher não mais uma máquina desgastada, mas um ser consciente e responsável por si mesma.
Reflexão em grupo, apoiada por um psicólogo, pode também ampliar uma visão crítica do papel da mulher na sociedade, facilitando um espaço de troca para um maior entendimento da interferência do processo climatérico na vida de cada uma. Isto facilita uma melhor elaboração das dúvidas, ansiedades, dificuldades na aceitação de mudanças e perdas que possam estar ocorrendo e um despertar da responsabilidade com a sua própria saúde. Num grupo pode-se discutir assuntos como sexualidade, imagem corporal, mitos e mentiras a respeito da menopausa e da reposição hormonal e outros que despertem interesse da maioria participante.
Assim, o objetivo principal do atendimento integral com abordagem holística é situar a mulher nessa nova etapa da vida, para que ela possa vivê-la como parte de um processo natural, e fornecer-lhe instrumentos que favoreçam a um maior auto-conhecimento. Por outro lado, ao se criar espaços para socializar informações sobre climatério e menopausa, aumenta-se muito a possibilidade da mulher tornar-se responsável por sua própria saúde e qualidade de vida.